Demissões em massa, layoff, por quê?

Os noticiários estão tomados pelas demissões em massa ou “layoff” na indústria da tecnologia. O que está ocorrendo? Quais são os motivos que fizeram de uma indústria, conhecida pela sua prosperidade estar enfrentando demissões? E como sobreviver neste cenário?

Sonho de muitos profissionais, a indústria da tecnologia, um mercado crescente, aberto, pouco regulamentado e com alta demanda de profissionais e, fomentando por uma busca continua por soluções para os desafios da nossa época começa a demonstrar uma fragilidade que, trás lembranças da bolha das Dotcom (1995-2001) mas com diferentes características e muito mais próxima da nossa realidade. 

Na época da bolha das Dotcom o Brasil dava pequenos passos na tecnologia. O que é completamente diferente no cenário atual. Segundo a FGV[1], no Brasil possuímos  447 milhões de dispositivos digitais. Na mesma pesquisa encontramos um dado, que demonstra um forte crescimento em gasto e investimento em TI chegando a 8,7% da receita das empresas. 

Segundo outra pesquisa, a indústria de TIC (que engloba TI, Telecomunicações etc.) foi responsável por 6.9% do PIB do Brasil em 2021 que correspondente a 598 bilhões de reais e empregou 1,5 milhão de profissionais. Já, no mercado de startups, o Brasil possui um total de 22.225 startups. E é neste mercado de startups onde está ocorrendo as demissões em massa. 

Segundo o site layoffbrasil o Ifood desligo 80 profissionais, Ebanx 340 profissionais e Americanas SA/B2W 400 profissionais, VTEX 200 profissionais e a lista segue com + de 30 startups. Este mesmo fenômeno, é observado em diferentes locais no mundo como Europa e Estados Unidos.

Com o ambiente contextualizado, fica mais claro descrever o que está ocorrendo. Existem várias variáveis que necessitam ser analisadas: ambiente global, modelo de negócio, mercado e investimentos. Portanto, contextualizar cada uma destas variáveis é uma ação necessária, demostrando a complexidade do tema.

Ambiente Global: 

O mundo anda complicado, nossa geração está passando por desafios que em teoria, pareciam estar superados e pertencer a épocas passadas. O mundo aparentemente estava caminhando bem, estávamos como sociedade avançando em temas como: ESG, transformação digital, qualidade de vida e, repentinamente, teve início uma pandemia que afetou, e ainda afeta milhões de pessoas no mundo. Quando minimamente estávamos iniciando uma reação ao cenário pandêmico, uma guerra completamente sem sentido foi iniciada, acompanhada de todos os pontos ruins como: violação de direitos humanos, territorial e a liberdade. As consequências foram fortes. Perdemos a nossa capacidade de produção com a falta de componentes, descobrimos que o outsource da capacidade industrial para outros países tinha um preço escondido, bem alto a ser pago. Estamos vivendo ainda, o ressurgimento da inflação.

Modelo de Negócios e Mercado:

O mercado de tecnologia globalmente está demonstrando alguns sinais de limite, o índex NASDAQ está em baixa desde Janeiro, e a MAAMA(Meta, Alphabet, Amazon, Microsoft e Apple) tiveram impactos de vendas gerando resultados menores e junto levaram as empresas menores para o mesmo cenário. 

Na tecnologia, temos vários modelos de negócio que podem ser aplicados, desde os modelos mais comuns aos mais atuais e complexos como o de ecossistemas. O importante do modelo de negócio, independente que qual o selecionado é ele “pare em pé” logo, a sua empresa/produtos devem ser rentáveis e gerar lucro. Parece obvio falar isto, mas esta não é a realidade de um grande número de startups. Boa parte destas startups não geram lucro e muitas não tem efetivamente um produto. Estas empresas, vendem aos investidores idéias, protótipos, canvas etc. e utilizam o investimento externo para desenvolver o produto. Outro grupo de startups tem efetivamente um produto lucrativo, mas, tem consciência que, a longo prazo não será possível sustentar a sua existência através deste produto. Logo, buscam investimento externo para sustentar a inovação, suas atividades e despesas.  Isto é o “cost of growth”, “burning cash” e “burn rate”. Exatamente o dinheiro que desapareceu. 

Investimentos

As rodas de investimentos, em todo o mundo vem demonstrando o desaparecimento dos investidores. O universo de startups brasileiras, europeias e americanas vem sentindo este impacto. Os investimentos em Late-Stage Series B+ (um dos termos usados para fazer referência ao crescimento da empresa através de investimento externo) teve uma redução de 8% na Europa e 12% no Q1 2022. O dinheiro não desapareceu, mas, diante do cenário mundial completamente incerto, o investimento em locais seguros é a opção atual dos investidores arrojados de anteriormente fazendo desaparecer o capital de risco.

Com as diversas variáveis desta situação expostas podemos chegar a algumas observações. Para os founders é importante destacar que esta situação não é uma surpresa. Não é de hoje que no mundo dos negócios sobrevive a empresa que demonstra capacidade de gerar lucro e crescer. O mercado de sonhos da tecnologia pode estar estabilizando, mas sempre existirá espaço para boas ideias, desde que, estas estejam baseadas em produtos reais e modelos lucrativos. É a hora de pensar em ser um camelo e não um unicórnio, startups camelo, crescem a passos menores, mas, não param diante das dificuldades. Voltar, ou muitas vezes, pela primeira vez, frequentar uma escola de negócios é sempre uma boa opção. As técnicas de gestão de negócios ensinam a sobreviver, lembre que hoje é o momento da tecnologia, mas no passado foi o aço, o motor, a energia etc.

Para os profissionais, empregados nestas startups ou recém-demitido destas, existem várias opções. Mas a melhor delas é continuar o seu processo de crescimento através dos estudos. Algumas pesquisas demonstram que, a maioria dos profissionais que perderam as suas vagas foram os mais novos na profissão ou os que realizam atividades na tecnologia como: PO, SM, PL e etc. Neste momento, a bagagem e a relevância da atividade fazem diferença. Fica a velha lição da cigarra e da formiga: “estudar quando a maré está boa garante o amanhã”.

Devo desistir da área da tecnologia? Absolutamente não! Temos um déficit enorme de profissionais, a tecnologia continua evoluindo e, não há dúvidas que este é o presente e boa parte do futuro. Startups, são somente um dos mercados dentro da tecnologia que agora encontrou a realidade do mundo dos negócios. Mas, para pessoas bem-preparadas sempre existirá espaço.

Cristiano Uniga Bajdiuk cristiano@cublab.tech 

https://orcid.org/0000-0002-8255-4597

Copyright © 2022 Cristiano Uniga Bajdiuk & Cublab; Todos direitos reservados. Reprodução ou divulgação total ou parcial deste documento é expressamente proibido sem o consentimento formal, por escrito, do Autor Cristiano Uniga Bajdiuk.

[1] Meirelles, F. S. Pesquisa Anual do Uso de TI nas Empresas, FGVcia: Centro de

TI Aplicada, 33a edição, 2022 (edições especiais sob encomenda) Questionário, Relatório e Apresentações em: www.fgv.br/cia/pesquisa

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